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O Bonnie and Clyde tupinambiquence

por Fernando Zocca, em 25.05.10

 

                     Donizete Pimenta era um líder por natureza. Ele não era fácil; consideravam-no bastante cruel, danoso. O bandoleiro convenceu todos à sua volta de que deveriam destruir o Van Grogue. E por ser aquela gente muito simples, não lhes restou alternativa a não ser a de obedecer ao chefe.

 

                        Pimenta era amasiado com Cristina, uma ex-prostituta que, numa tarde, após um programa num motel, ao perceber ser possível construir um relacionamento duradouro, substituiu as atividades de marafona, pelas de catadora de papelão, nas ruas da cidade.

 

                        Depois de a ter tirado da vida devassa que levava, Donizete propôs-se a dar à Cristina uma ocupação lícita num boteco. A direção estaria a cargo da concubina.

 

                        Mas por ser imatura, desconhecer o alfabeto, ter o vício do tabagismo e alcoolismo arraigados, Cristina não se deu bem no trato com os homens, que chegavam todas as tardes, para beber e jogar conversa fora.

 

                        Além disso, a ex-catadora de lixo precisava conciliar as receitas e despesas do boteco. Da féria diária tinha de sair os valores para cobrir as despesas com a bebida, o cigarro e as demais imprevistas, que surgissem durante o dia.

 

                        As dificuldades para somar 2 + 2, toda vez que precisava negociar a mercadoria do boteco, constrangiam a mocinha de cabelos longos e pretos, que vendo-se sem graça, logo notou quebrantada sua disposição para o comércio.

 

                        Bom, o que fazer então pra ganhar a vida, se o bar que tinham não lhes dava o sustento? Foi Donizete quem teve a ideia de processar o pai das duas crianças da Cristina. Com as pensões alimentícias manteriam-se no imóvel que fora de seus pais. Eles não pagariam aluguel.

 

                        Mas foi  ai que apareceu Van de Oliveira Grogue para ocupar uma casa vizinha a do Donizete. A antipatia foi imediata.

 

                      Começaram então as provocações.  Cristina mandava suas filhas, logo pelas manhãs, jogar defronte a casa do Grogue,  partes do lixo que furtara dele  nos dias anteriores.

 

                        E por acharem-se moradores antigos do bairro, Donizete e Cristina convenceram-se de fazer com que aquele vizinho esquisito se mudasse logo dali. Uma das estratégias do casal  era provocar muito barulho durante as refeições.

 

                        Assim toda vez que Grogue sentava-se para almoçar ou jantar, logo um cachorro iniciava os latidos que duravam o tempo exato das refeições.

 

                    Sucediam-se os trotes pelo telefone. Pelo correio não paravam de chegar folders e outras chateações. Quando saiam à tarde para beber nos botecos do bairro o casal Bonnie and Clyde tupinambiquence não deixava de espalhar boatos sobre o novo morador indesejado.

 

                        As provocações sucederam-se até o momento em que a dupla de meliantes, arregimentando outros delinquentes, cercou a casa do Grogue e tentou agredí-lo.

 

                        A pancadaria foi memorável. Mas como toda arruaça logo cessou. Nem as autoridades do município de atreviam a intervir em tão tenebroso caso.

 

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publicado às 22:29

As Palavras do Donizete

por Fernando Zocca, em 03.05.10

 

                                Donizete Pimenta era um cara muito chato. Ele teimava em fazer seu enteado passar a noite toda acordado para que ouvisse as histórias que tinha pra contar.
                               Por ser incapaz de contrariar a vontade do Pimenta chato, o menino fazia as vontades do cara. Na verdade o mocinho queria dormir para acordar esperto, sair às ruas e gozar os prazeres do ar livre e do sol abundante.
                               Mas não. Nada disso. Para morar naquela casa, comer daquela comida o menino tinha que submeter-se ao Donizete Pimenta, o sujeito mais implicante que a Vila Dependência já vira.
                               Até mesmo o prefeito da cidade o ilustríssimo senhor professor doutor Jarbas exclamava, quando no gabinete alguém mencionava a agitação promovida pelo tal Pimenta:
                               - O quê? Misericórdia, não me fale nesse assunto. Pelo amor de Deus!
                               E assim seguia a sina do garoto que já evidenciava sinais de efeminação. É que por ser bastante rude e cruel Donizete só parava de agredir, tanto moral quanto fisicamente o seu enteado, quando este apresentava reações próprias das meninas.
                               Então pra não apanhar e ser xingado, o garoto tinha que desmunhecar. E como ele já se tornava um adolescente, a certeza de que sua escolha sexual seria o homossexualismo evidenciava-se a cada dia.
                               Na vizinhança ninguém esperava outra coisa. O enteado do Donizete seria o mais novo, belo e lindinho gay produzido em Tupinambicas das Linhas.
                               Na noite de domingo para segunda-feira o obsessor contara a mais torturante história sobre os médicos, enfermeiros e banheiros públicos. Quase ninguém sabia, mas Donizete era paradão em banheiros.   
                               Diziam os vizinhos da esquina que o Pimenta ficava ligado o dia todo escutando os barulhos que chegavam das casas do entorno. Quando alguém puxava uma descarga ou ligava um chuveiro ele se excitava todo.
                               O pessoal do centro de reabilitação de Tupinambicas das Linhas não tinha como medicar o Donizete, pois ele mostrava-se refratário aos apelos das autoridades. Com isso a inquietude propagava-se pela cidade, do mesmo jeito que a dor de uma infecção na unha encravada dum dedão, se irradiava pra todas as demais partes do corpo.
                               Mal sabia o moço perturbado, que as palavras proferidas por ele, ali naquele quintal sujo, depois de girarem pelo mundo, retornariam com a força sextuplicada para ele mesmo.
                               Quem não conhece a história do bater das asas da borboleta?   Se um simples movimento, de um bichinho tão delicado, desencadeia uma miríade de ocorrências para todas as pessoas, imagine os desastres que provocavam as palavras carregadas de ódio, proferidas diuturnamente pelo famoso Donizete Pimenta.
                               Ele não era fácil, minha amiga.
 
 

 

O Passeio Socrático

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publicado às 19:26


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