Nestes últimos dias tivemos algumas notícias destacadas relacionadas aos animais. A primeira delas nos dá conta de um dentista que, no Zimbábue, matou um leão estimadíssimo do povo e das autoridades do lugar. Da informação consta que ele teria pago alguns milhares de dólares na aquisição do suposto direito de matar a fera. Há contradições quanto a legitimidade ou não do ato maligno do dentista; a princípio, porém, ele agiu de forma errada tendo posto fim à vida de um animal conhecido, tratado e estimado por seus próximos. Buscando defender-se o odontologista garantiu que sua vítima não era o tal festejado leão, mas sim um parente dele. Entretanto, ocorrência passada na vida do saca-molas, como por exemplo, o fato de já ter sido condenado, pela morte de um urso, surgiu reforçando a tese da sua culpabilidade. É claro que diante dos fatos, das provas e da legislação vigente deve o caçador responder por seus atos. Outra notícia relacionada aos felinos nos informa sobre o recentemente falecido dono de circo Orlando Orfei, que na década de 1970, permitia a entrada das crianças às sessões, recebendo como pagamento gatos vivos. Segundo os comentários Orfei, assim como os imperadores romanos, que lançavam no coliseu, às feras os cristãos, jogava aos leões os gatos vivos. A crueldade contra os animais expressa bem a natureza do coração do maldoso. Se o sujeito faz isso com cães, gatos, leões ou qualquer outro bicho indefeso, o que não faria com mendigos, crianças, adolescentes vulneráveis ou pessoas idosas? Diz um velho ditado "É melhor prevenir do que remediar". Por que esperar a gravidez da enteada adolescente, o estupro continuado do menino deficiente ou o assassinato do tio gay, se os fatos do dia a dia evidenciam a iminência das ocorrências?
A vovó Rosinha levantou-se bem cedo na quarta-feira e sentindo o gosto do mau hálito horrível, botou a língua enorme para fora, caminhando assim até o banheiro onde a olhou no espelho.
A bocarra da Rosinha estava já sem os dentes e o tamanho avantajado da língua fizeram seus pais imaginarem, logo que ela nasceu, ser aquele neném esquisitinho, um tanto quanto que diferente das outras crianças.
Ao se olhar no espelho Rosinha viu os cabelos cinza desgrenhados e escassos que lhe adornavam o rosto inchado. A medicação psiquiátrica receitada pelo doutor Silly Kone fazia-a dormir bem, no entanto a ressaca na manhã seguinte era desagradabilíssima.
A mulher percebeu que seu ventre, avolumado, não permitia que ela visse os próprios pés, cujas unhas estavam deterioradas. As micoses corroeram as dos dedões deixando um aspecto horrível.
Os braços manchados, com as marcas dos embates dos tijolos, pedras, areia, saibro e cimento, por ela usados nas reformas das casas, de sua propriedade, exibiam feridas inflamadas, por vezes frequentadas pelas moscas, durante boa parte dos dias.
Quando a velhinha chegou à cozinha encontrou Gererê o marido a quem considerava um traste, mas indispensável.
- Já fiz o café, Rosinha. Ocê demorou pra acordar hoje. O que foi? Errou na dose do hipnótico? – indagou ele mordendo um pedaço de pão com mortadela.
- Nada disso. Demorei pra pegar no sono. Estava pensando naquele inquilino que não paga o aluguel faz 7 meses. – o mau humor da mulher era perceptível no seu tom de voz agressivo.
- Hoje nós vamos até lá e a gente bota todo mundo pra correr. Ocê vai ver só. – Gererê era um homem decidido, famoso por resolver suas questões com bate-bocas homéricos, que humilhavam os oponentes diante dos vizinhos.
- Não vou hoje, não. Logo cedo tenho que ir na comadre Diva. Foi ela que me vendeu aquele terreno que não vale nada. Quero trocar, negociar outra coisa. – respondeu a vovó sentando-se para o café matinal.
Gererê que terminara a refeição sacou do maço um cigarro, tirou dele o filtro e o acendeu. Assoprando a fumaça por cima da cabeça da mulher e coçando o saco, quis saber se ela demoraria na visita à comadre Diva.
- Não vou demorar. É só o tempo de rasgar aquele contrato. Dizem que o loteamento não está certo. Que o Jarbas e também o Zé Lagartto estão envolvidos numa fraude com terras – respondeu Rosinha sorvendo o seu café sem açúcar.
Gererê levantou-se, puxou a calça que se entranhara no vão dos glúteos e saiu arrastando as havaianas rumo ao banheiro.
- Vê se fecha a porta! – gritou a velhota antes de ouvir os ruídos da depuração.
Num segundo Rosinha pareceu sair do ar. Seu olhar desconectou-se dos objetos que a rodeavam e, com a xícara parada defronte os lábios, cotovelo fincado na mesa, ela viu-se no dia do casamento.
Os preparativos para a festa foram emocionantes, inesquecíveis. A maioria dos parentes mais próximos, os vizinhos e até os filhos – sim os filhos, pois quando Rosinha se casou, já tinha três filhos – todos se uniram para promover a maior e melhor festa de casamento que a Vila Dependência, de Tupinambicas das Linhas jamais vira. Foi a glória! Teve até rojão e bombinha.
Como se fosse um autômato Rosinha levou a xícara à boca e sorveu um gole de café. Mas quase engasgou quando se recordou que durante a cerimônia, ao tomar o vinho, oferecido pelo sacerdote, perdeu a ponte caída dentro do cálice.
Sem se sentir muito constrangida, a noiva botou a mão dentro do recipiente tirou de lá a prótese e a encaixou entre os caninos.
Quando terminava o seu café Rosinha pôde ouvir lá do quarto o grito de Murino, o filho babá, que pedia pra ser atendido.
De dentro do banheiro Gererê esgoelou:
- Quando vai ser a próxima consulta, dessa coisa, com o Silly Kone?
Naquele momento Rosainha não quis nem saber. Vestindo rapidamente uma saia verde, os chinelos havaianas amarelos e uma blusa cor de rosa, ela saiu para caminhar pelas ruas de Tupinambicas das Linhas. Naquela manhã ela não tinha hora pra voltar. De tão ressentida seria capaz de encher a casa do vizinho com uma tonelada de tinta spray.
Muita gente em Tupinambicas das Linhas queria mesmo acabar com o Van Grogue. Consideravam-no um sujeito chatíssimo, metido a besta, que não entendia nada de nada e que pretendia palpitar indevidamente sobre todos os assuntos da cidade.
O pobre Van de Oliveira Grogue acreditou nisso e, recolhendo-se à sua atribuída insignificância, não desejou mais sair de casa. Nem ao dentista ele ia.
Mas sucedeu que seus dentes, a cada dia que passava, cariavam e, as dores, ao surgirem, tiravam-lhe o sossego por ele tão bem querido.
No meio do conflito Grogue não sabia como proceder. Afinal, como ele mesmo poderia sanar aquele problema? Como arrancaria, com as próprias mãos, o nefasto foco da infecção impregnante? Seria isso possível? E se fosse, como proceder?
Ele não tinha experiência disso, mas sabia de pessoas que, de um jeito ou de outro, solucionavam essa questão de alto interesse para o desenvolvimento, inclusive do lugarejo em que vivia.
Tupinambicas das Linhas, por ser um lugar retrógrado, com gente lesada por todos os lados, mantinha tradições inquestionáveis. E dentre elas havia aquela em que garantia ser o dentista o único sujeito possível, capaz de livrar um pobre coitado das dores inclementes causadas pelas cáries.
Grogue estava disposto a provar que essa tese não era absoluta. Que haveria exceções. Então ele, naquela manhã de segunda-feira foi ao bar do Bafão, onde encontrou bebericando o velho Gonça. Para quem não sabe o Gonça era um sujeito alto, barrigudo, de fala fina e trejeitos bastante delicados. Segundo as más línguas, sempre ativas na cidade, Gonça era daqueles que gostava de “agasalhar o croquete”.
- Gonça, gente fina que entende de alface e cenoura melhor do qualquer outra alma desta cidade, me diga: como faço pra arrancar um dente sem ter de recorrer a um dentista? – indagou Grogue, erguendo os braços, assim que pisou no chão do boteco.
- Grogue, quereeeedo, a quanto tempo não te vejo! Por onde andaste criatura? Mas nossa, que barriga é essa biba encruada? Da última vez que a vi você não estava tão acabado assim! – Gonça não tinha papas na língua. Se tivesse que escolher entre a piada e a manutenção da amizade, ele escolhia a piada.
- Vida boa, quereeedo. – respondeu Van de Oliveira, sentando-se ao lado de Gonça.
- Dizem que você é professor de araque, é verdade isso, Gonça, ou é intriga dessa negadinha sem educação? – Quis saber Van de Oliveira, ao acomodar-se e sinalizar ao Bafão que lhe trouxesse um copo vazio e bem limpo.
- Sempre dei aulas sobre a composição dos solos, química, física e os cambaus meu querido. Estou a caminho da aposentadoria. Não sei e nunca soube muito sobre os assuntos que lecionei. Mas você sabe como é, né, quereeedo? Quem tem padrinho não falece pagão. É verdade ou mentira?
- Não entendo nada disso. Sei que estou com uma tremenda dor de dentes e não quero ir ao dentista. Como faço?
- Eu conheço um pessoal que reside na periferia da cidade que tem certa experiência na solução de problemas desse tipo. – respondeu Gonça ingerindo mais um gole de cerveja fria.
- Me diz, me diz, logo criatura. Não posso perder mais tempo! – o tom de voz do Van de Oliveira era de sofrimento, de queixa.
Pondo a mão direita sobre o joelho esquerdo do Grogue, Gonça o gorducho, passou-lhe todas as informações necessárias para que ele chegasse à comunidade onde os próprios moradores resolviam seus problemas, inclusive os causados por cáries dentárias.
Sem esperar pelo Bafão com seu copo limpo, Van de Oliveira levantou-se e tomando um táxi pôs-se a caminho do local onde ele achava estar a solução para os seus problemas.
- Grogue cuidado que lá o pessoal só trabalha “mamado” quereeedo! – tentou avisar Gonça que ficou na dúvida se o amigo ouvira ou não a mensagem.
Quem gosta de novelas deve ter assistido Caminho das Indias, da Glória Perez, exibida pela Rede Globo, antes de Viver a Vida.
Se você não se lembra, no último capítulo o personagem Raj vivido por Rodrigo Lombardi, reconcilia-se com Maya, que era a personagem da Juliana Paes.
Depois de muitas idas e vindas, conflitos causados pelo ciúme, ódio, paixão e desejos de inserção dos intocáveis na sociedade, tudo termina muito bem com o casal protagonista vivendo felizes para sempre.
Ocorre que logo depois do reatamento entre Raj e Maya, ele teve de levá-la ao dentista. O doutor Hermínio era um profissional zeloso, conhecidíssimo e muito popular lá na India. Apesar de ter a fama de beberrão e tabagista, ele exercía muito bem o ofício que escolhera para ganhar a vida. Hermínio era auxiliado pelo estagiário conhecido como Leandro, que se encumbia da manutenção do instrumental.
Essa passagem não foi contada pela autora da novela, mas o pessoal do seu Blog mais querido pesquisou muito e depois de ter filmado a cena exibe-a a você amado leitor.
O profissional Hermínio, auxiliado pelo estagiário Leandro, demonstram uma ótima atuação profissional, no campo em que trabalham.