Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Informação e entretenimento. Colabore com a manutenção do Blog doando para a conta 0014675-0 Agência 3008. Caixa Econômica Federal.
Henriqueta Fossa e Elisa Buffa conversavam na esquina:
- E aí, amiga? Sarou da ressaca? - perguntou Elisa.
- "Mardita" pinga aquela que me deram... Me fez um "mar" terrível - respondeu Henriqueta.
- Toma um chá de boldo, comadre. Você vai ver tudo melhora - consolou Elisa. E depois concluindo:
- A senhora já passou dos 82 anos. Não seria bom parar com a talzinha?
- Que nada filha... O que é que a gente vai fazer numa quiçaça dessas? Se não tem o boteco, o que a gente faz?
- Mas dona Henriqueta... E o crochê, minha nega? - provocou Elisa.
- E lá eu sou velhota de crochê? Ora faça-me o favor dona Elisa. E me dê licença que meu feijão está no fogo; parece que a panela tá bufando.
- Vai dona Henriqueta... Vai... Vai tomar... Lá na sua cozinha, conta do seu feijão.
Depois do almoço, lá pelas três horas da tarde, Henriqueta saiu de casa e foi direto ao armazém da esquina onde pretendia comprar o leite e o pão para o café da tarde.
Como não gostava de caminhar pela calçada, a velhota, alta, magra, desengonçada, que falava grosso devido a um problema na garganta, iniciou o percurso pelo meio da rua.
Enquanto caminhava um automóvel vendendo pamonha anunciava pelo alto-falante:
- Olha a pamonha, senhora dona de casa. É o legítimo creme do leite. É a pamonha de Tupinambicas das Linhas. Venha conferir minha senhora...
Henriqueta sentiu-se incomodada. Teria sido aquela funesta Elisa Fossa, a vizinha maledicente a responsável por essa gandaia toda no quarteirão? Quem é que aguentava tanta judiação?
Não teve tempo de concluir o seu raciocínio porque já tinha chegado ao armazém.
Havia um pessoal aglomerado, esperando numa fila, a vez de pagar o que comprara, no caixa.
Sentindo-se insegura Henriqueta imaginou que se estivesse na sua cidade natal, Salvador, na Bahia, estaria bem menos nervosa.
- Seu Messias, eu quero 24 pães. Me põe em dois sacos, faz o favor. E me dê também um litro de leite de caixinha. De saquinho já ando cheia.
Messias conhecia bem a figura. Olhou-a por cima dos aros dos óculos e disse:
- Ô Almeida: atende a dona Henriqueta. Que ela tem pressa.
Almeida, atrapalhado com as suas 1001 ocupações no armazém, deixou o que fazia e atendeu a freguesa dando a ela o que pedira.
Saindo com os embrulhos Henriqueta sentenciou:
- Põe tudo na minha conta, seu Messias, lindinho da vovó, que no final do mês a gente pagamos.
Messias tirou a caneta que estava equilibrada na orelha direita e anotando a despesa numa folha de papel, passou a receber o dinheiro dos demais que estavam na fila.
Na volta, caminhando pelo meio da rua Henriqueta sentiu-se obrigada a usar a calçada porque um caminhão vendendo gás de cozinha passava anunciando, tendo ao fundo a sinfonia Für Elise, do compositor alemão Beethoven, a mercadoria pelo alto-falante:
- É o gás, meu amigo, minha amiga e senhora dona de casa. Aproveite a promoção. Leve agora o seu gás e ganhe um brinde lindo.
Chateada Henriqueta chegou a sua casa. Quando se preparava para tomar o café alguém tocando, com insistência a campainha foi logo lá de fora gritando:
- Como é sua velha safada!!! Quando vai pagar os 182 reais que me deve?
Era Elisa Buffa que, acarinhando a barbicha branca de um bode velho, parada defronte ao seu portão, incomodava-a mais outra vez.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.