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A porca no rancho de pescarias

por Fernando Zocca, em 02.02.20

 

Petúnia pig.png

 

Há alguns anos passados, numa certa ocasião, fomos convidados por alguns colegas, a permanecer uns dias num rancho de pescarias na beira do rio.

Passadas várias horas depois da nossa chegada, numa tarde, apareceu repentinamente um vendedor puxando um carrinho de mão - uma espécie de carroça - sobre a qual havia mandiocas, laranjas e uma porca.

Na verdade o bicho era uma pequena leitoa que, agitada entre as mercadorias do ambulante, dava sinais de que a qualquer momento escapuliria do seu proprietário perdendo-se no emaranhado confuso da vizinhança.

 - O senhor não me faria a gentileza de guardar, por um tempinho, essa minha porca enquanto vou ali atender uma freguesa que comprou de mim essas duas dúzias de laranjas e os dois quilos de mandioca? – perguntou-me o carroceiro velho.

Observando que a bicha não parava quieta, não tinha sossego, concordamos com seu dono trazendo o animal para dentro da casa; logo percebemos que o tal mamífero buscava alimento.

Colocamos então numa vasilha um pouco de café com leite além duns pedaços de pão, servindo desta maneira, a porquinha esfaimada.

O atirar-se com sofreguidão sobre os alimentos e a ingestão atabalhoada nos fez pensar que há muito o pequeno animal não comia.

- Nossa! Ocê viu como ela se "pincho" em cima das coisa? - perguntou Sinhá Chica, a velhinha aposentada presente no local.

De fato a volúpia, a pressa, com que o bichinho botou para dentro o alimento talvez tivessem sido as causas do imediato regurgitamento seguido duma evacuação profusa e mal cheirosa de fezes.

Diante de tanta sujeira, maus odores, e o voejar pertubador das moscas, não tivemos outra ideia do que a de lavar a pequena porca no chuveiro.

Com a mangueirinha e esguichos fortes de água morna os restos de vômito e cocô foram, aos poucos, sendo diluídos.

Limpa dos dejetos, outra melhor sugestão, de que devíamos devolvê-la rapidamente ao seu dono, não nos ocorreu naquele momento.

Depois de uma ou duas horas o carroceiro, ofegante, com a língua grande e grossa pra fora, apareceu.

Nem bem perguntou por seu animal e a porquinha pulou dentro da carriola.

E lá se foram o dono e seu bicho rua abaixo.

Passados alguns dias qual não foi a nossa surpresa ao ver que depois de liberta, completamente asseada, a suína hiperativa voltou à mesma sujidade com que certamente estava habituada e sem a qual nunca se sentiria tão bem.

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publicado às 22:45

O Bonnie and Clyde tupinambiquence

por Fernando Zocca, em 25.05.10

 

                     Donizete Pimenta era um líder por natureza. Ele não era fácil; consideravam-no bastante cruel, danoso. O bandoleiro convenceu todos à sua volta de que deveriam destruir o Van Grogue. E por ser aquela gente muito simples, não lhes restou alternativa a não ser a de obedecer ao chefe.

 

                        Pimenta era amasiado com Cristina, uma ex-prostituta que, numa tarde, após um programa num motel, ao perceber ser possível construir um relacionamento duradouro, substituiu as atividades de marafona, pelas de catadora de papelão, nas ruas da cidade.

 

                        Depois de a ter tirado da vida devassa que levava, Donizete propôs-se a dar à Cristina uma ocupação lícita num boteco. A direção estaria a cargo da concubina.

 

                        Mas por ser imatura, desconhecer o alfabeto, ter o vício do tabagismo e alcoolismo arraigados, Cristina não se deu bem no trato com os homens, que chegavam todas as tardes, para beber e jogar conversa fora.

 

                        Além disso, a ex-catadora de lixo precisava conciliar as receitas e despesas do boteco. Da féria diária tinha de sair os valores para cobrir as despesas com a bebida, o cigarro e as demais imprevistas, que surgissem durante o dia.

 

                        As dificuldades para somar 2 + 2, toda vez que precisava negociar a mercadoria do boteco, constrangiam a mocinha de cabelos longos e pretos, que vendo-se sem graça, logo notou quebrantada sua disposição para o comércio.

 

                        Bom, o que fazer então pra ganhar a vida, se o bar que tinham não lhes dava o sustento? Foi Donizete quem teve a ideia de processar o pai das duas crianças da Cristina. Com as pensões alimentícias manteriam-se no imóvel que fora de seus pais. Eles não pagariam aluguel.

 

                        Mas foi  ai que apareceu Van de Oliveira Grogue para ocupar uma casa vizinha a do Donizete. A antipatia foi imediata.

 

                      Começaram então as provocações.  Cristina mandava suas filhas, logo pelas manhãs, jogar defronte a casa do Grogue,  partes do lixo que furtara dele  nos dias anteriores.

 

                        E por acharem-se moradores antigos do bairro, Donizete e Cristina convenceram-se de fazer com que aquele vizinho esquisito se mudasse logo dali. Uma das estratégias do casal  era provocar muito barulho durante as refeições.

 

                        Assim toda vez que Grogue sentava-se para almoçar ou jantar, logo um cachorro iniciava os latidos que duravam o tempo exato das refeições.

 

                    Sucediam-se os trotes pelo telefone. Pelo correio não paravam de chegar folders e outras chateações. Quando saiam à tarde para beber nos botecos do bairro o casal Bonnie and Clyde tupinambiquence não deixava de espalhar boatos sobre o novo morador indesejado.

 

                        As provocações sucederam-se até o momento em que a dupla de meliantes, arregimentando outros delinquentes, cercou a casa do Grogue e tentou agredí-lo.

 

                        A pancadaria foi memorável. Mas como toda arruaça logo cessou. Nem as autoridades do município de atreviam a intervir em tão tenebroso caso.

 

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publicado às 22:29

O Tamanduá-de-colete

por Fernando Zocca, em 18.03.10

 

O tamanduá-de-colete.
 
                O escritor, advogado e blogueiro Fernando Zocca lanço pelo site www.clubedeautores.com.br o seu sexto livro. Trata-se de O Tamanduá-de-colete que promete contar tintim por tintim todas as intrigas e desavenças acontecidas durante os últimos três meses na Vila Independência.
                Os textos, que formam o livro de 131 páginas, foram publicados nos blogs do autor. É uma coletânea de narrativas dos fatos diários do bairro da cidade, que merece fazer parte da sua coleção. Por apenas R$ 56,52 você adquire o seu exemplar. Compre já.
 
Leia também O Castelo dos Espíritos.
Neste trabalho o autor relata suas experiências durante as internações psiquiátricas num hospital espírita. Ele presenciou a crueldade com que alguns submetidos eram tratados, suas reações como o suicídio e o crime.

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publicado às 16:30

A Múmia Caipira

por Fernando Zocca, em 01.12.09

 

                        - Van Grogue, carniça do inferno! Carroceiro analfabeto! Cortador de cana e bicha velha enrustida, então você acha que pode fugir das obrigações de sustentar o filho que arrumou durante as farras que fazia? Você acha, retardado mental, que por ser dono de uma empresa de transporte, com centenas de caminhões, o cara pode se livrar de um reconhecimento de paternidade e de pagar pensão alimentícia? – gritou à entrada do bar do Bafão, Anermínica a baranga de canelas finas.
                        Os presentes cessaram as conversas e durante o silêncio que se instalou a mulher magérrima, que vivia movida por moderadores de apetite, continuou:
                        - Pisa retardado! Pisa na esperança de reconhecimento da criatura ilegítima que você fez vir ao mundo! Besta inútil, comendador do demônio! – Anermínica parada na porta aguardava a reação violenta do homem instigado, mas o que ela via era a troca de olhares de espanto entre os bebedores.
                         - Mexa-se derrotado! Chicana não apaga a verdade escrita na sua consciência. Múmia caipira! – enquanto falava a mulher mantinha o punho direito, a exemplo do cabo de uma caneca, dobrado na altura da cintura. Entre os dedos indicador e médio da mão esquerda, ela premia um cigarro do qual aspirava a fumaça de tempos em tempos.
                        - Mas o que se passa? – indagou ao Bafão o atordoado Van Grogue.
                        - Eu é que vou saber? Vocês arrumam confusão e ainda não sabem de nada? – respondeu o dono do boteco.
                        - Vou botar o Aníbal carroceiro na sua cola, sua besta! Você vai ver o que é bom pra tosse! – prosseguiu a mulher. Você não me escapa. Nem ouse pensar em beber água daquela sua caixa d´água! Você não sabe o que te espera, corintiano sujo!
                        Adam Oly que encostado no balcão, bebericava sua segunda cerveja, não escondia o desagrado que as palavras berradas pela mulher, causavam nos circundantes.
                        - Mas que chateação. – resumiu ele.
                        De repente Anermínica sentiu-se mal. Ela jogou o cigarro e levando a mão esquerda à cabeça, procurou com a direita apoiar-se no balcão.
                        - Um cardiologista! Depressa, um cardiologista! Socorro, misericórdia! – gritava ela com a cabeça baixa. Ante a inércia dos homens assustados ela prosseguiu com voz tremula:
                        - Bando de lesados! Ninguém me ajuda? – queixava-se Anermínica - Ah, é assim? Vou jogar uma praga em vocês!  
                        Bafão temendo que os fregueses debandassem por causa do escândalo da mulher, por ele considerada bastante descompensada e saliente, ligou o rádio, visando abafar o alarido desconfortável. Mas a lengalenga prosseguia:
                        - Van Grogue, bicha velha aidética! Vai ficar louco! Vou fazer você andar enlouquecido pelas ruas e estrada da cidade, você não perde por esperar. No-jen-to!
                        Enquanto pronunciava a imprecação Anermínica notou que Luisa Fernanda entrava no boteco. Ela vinha toda serelepe e faceira. O rosto avermelhado, era sinal de quem, já pela manhã, fizera uso da água-de-cana.
                        - Mas o que você está fazendo aqui, querida? Nossa, você está bem? – indagou surpresa Luisa Fernanda, depois de pousar uma garrafa de cerveja sobre o balcão.
                        - Então você não sabe, neném? – respondeu com outra pergunta a magricela de canelas finas.
                        - Não lindinha, não sei de nada, não.
                        - É esse tal de Van Grogue. O cara pensa que não vai pagar pensão alimentícia pra filha que teve. – Anermínica estava bastante indignada.
                        - Ah, ele até parece o Célio Justinho, que achava que ia se livrar do peso na consciência por causa da morte da primeira mulher dele.
                        As comadres davam a impressão de que a conversa se prolongaria por tempo ilimitado e por isso Bafão aumentando o volume do rádio fez com que todos ouvissem a festa de uma torcida organizada que se manifestava:
                        - Ão, ão, ão, o Flamengo é campeão!
                        Van Grogue e Bafão se olharam quando o primeiro perguntou:
                        - Será?
 
 
Fernando Zocca.
                         
                       
                       
 

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publicado às 13:08

A betoneira e a carroça

por Fernando Zocca, em 27.07.09

 

As pessoas vivem em comunidades e, nos lugares mais atrasados, parece que algumas pretendem dominar a região impondo suas vontades pela força de animais.
                                   Geralmente a insanidade, a ignorância e a estupidez fazem com que algumas almas doentias ajam impelidas pelo ódio e a inveja. Com o senso embotado pelo álcool, tabaco e outras drogas, essas pessoas tem o julgamento equivocado embasadores de atitudes impulsivas próprias dos loucos.
                                   Não é raro o cometimento de crimes contra a vida, praticados contra algumas vítimas que mal podem se defender. É o império da violência, do machismo, do autoritarismo, que ainda viceja forte, em algumas regiões da cidade.
                                   O predomínio da grosseria significa a derrota da educação, da própria política educacional do município, dos bons modos, da cordialidade no trato, que são valores pelos quais o homem brasileiro é conhecido.
                                   O sistema educacional da cidade vê em tais casos, a ineficácia de suas ações e intenções. A prevalência da estupidez, reforçada por percepções doentias e fora da realidade, indicam uma região mórbida na urbe, que os responsáveis políticos se recusam a enxergar.
                                   A omissão das autoridades legislativas e do executivo sugere a cumplicidade nas irregularidades, que atentam descaradamente contra a ordem legal do município.
                                   Assim, estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços escudados por atitudes negligentes, desses ocupantes do mando, agem desafiando a lei, não preenchendo os requisitos exigidos pelas normas.
                                   Então bares, oficinas, e outras atividades que deveriam apresentar alvarás, quitação de taxas e demais impostos, atuam sem a mínima observância das tais exigências.
                                   Sem recursos o município vê-se obrigado a buscar verbas junto aos governos estadual e federal para pagar suas contas.
 
 
 
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publicado às 14:42


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