Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]



O bar

por Fernando Zocca, em 19.10.09

 

- E aí pantera, tudo bem?
 
Ele entrara duma forma tão silenciosa que quando o vi estava já ao meu lado quase fungando no meu cangote. Assustada, achei que poderia ser mais um aproveitador. Não respondi. Continuei lavando meus copos. Era um moreno jambo, alto pra caramba, cara de safado, cabelos divididos à esquerda, igual ao John F. Kennedy, e tinha um bafo de cigarro dos infernos.
 
Ele pediu uma cerveja. Sentou-se à mesa do meio. Foi o primeiro cliente do inicio da noite daquela quinta-feira triste. Com um movimento rápido, feito felino, capturou com a mão direita, o jornal que dormia sobre o balcão. Ao sentar-se buscou o maço dos cigarros, no bolso esquerdo da camisa de mangas curtas.
 
Ajeitei meus cabelos encaracolados, curtos e louros. Eu achava que deveria tingi-los de cobre, já que o amarelo-palha dava um destaque muito bem feio pros meus olhos azuis. E depois tinha mais: aquela minha pele alva era terrível. Não podia tomar um minutinho só de sol que tudo ficava ardendo feito um não sei quê.
 
Eu via unicamente momentos de tristeza. Meus pais acabavam de separar-se. Ouvia eu, às escondidas, as conversas, e disfarçava, assim como quem não entendia nada. Mas pude perceber que minha mãe traíra meu pai. Ele fora motorista de caminhão e enquanto estava fora ela aproveitava, enfeitando a fronte dele com os galhos ostensivos e exuberantes.
 
Imaginava que mamãe fizera aquilo como vingança eis que ele a enchia de sopapos e pancadas, todos os dias, quando chegava da rua, torto com tanta cana.
 
O silêncio incomodava-me. Liguei o rádio. Estava quase na hora do resultado do bicho. Minha tia, lá no andar de cima, daquele sobrado antigo, junto com outro tio, seu irmão, tramava algo que eu cismava ser a captação de apostas. O telefone funcionava incessante e o radio a pilhas informava o necessário pro deslinde da banca.
 
Um outro meu tio, xarope nato, a verdadeira ovelha negra da família, deveria substituir-me, já naquela altura do campeonato. Eu estava exausta. Fizera, na máquina primeva, os sorvetes de massa que seriam vendidos, no dia seguinte, aos escolares da escola velha e chata, plantada defronte ao bar. Mas o louco, que lembrava Adolf Hitler, estava fechado no banheiro, quem sabe fumando mais um baseado enorme feito com a erva maldita.
 
Não poderia dizer, o que aquele matuto tinha em comum com a besta apocalíptica. Talvez fosse o parentesco em satã, evidenciado nas estripulias que aprontava pelas madrugadas, movido à maconha e mamãe-de-luanda, quando a cidade ainda ronronava.
 
Aquele tio, como já disse, era análogo ao demônio. Um dia, chamou-me ao banheiro, onde simulava fazer xixi, e mostrou-me aquela coisa cabeçuda, vermelha e que parecia crescer quando cheguei perto. Senti meu rosto afoguear-se. Meu coração pulava. Ele mandou-me segurar na pontinha. Virei o rosto enojada, e corri. Imagine! O que era aquilo, minha amiga?
 
Nos dias subseqüentes, quando percebia que eu estava encerrada no banheiro, batia de leve na porta, pedindo-me com voz sussurrante, que a abrisse. Se relutasse, ele colocava logo pelo vão, uma nota de cinco mangos. Aquela agonia, que me dava, não impedia de recebê-lo e fazer o que mandava sua loucura.
 
Contei a história pra minha tia-dona-da-banca e ela achou que deveria rogar uma praga bem forte nele. O arrenegado seria perseguido por onde quer que fosse. Até ao Rio de Janeiro, por caronas, o danado seria conduzido; e se fosse possível, deixado lá com os malvados que dariam um fim naquela sua vida fodida e nefasta.
 
Se o cancro fizesse cursinho, seria perseguido. As opiniões que se formariam ali junto aos professores, funcionários e alunos seriam das piores com relação a ele.
 
Se o porco entrasse na faculdade, todos menos ele saberiam, que era uma besta e que deveria ser deixado de lado, no ostracismo. Ele não teria consciência que a maioria saberia sobre seu passado tenebroso e maligno.
 
Aquele destino estava traçado: sanatório, cadeia e cemitério.
 
- Outra cerveja, meu bem!
 
O moreno, de pé, quase ao meu lado, fazendo cara de tarado e, soltando os bagos com espalhafato, olhava-me em meu devaneio. Aquela olhadela eriçou-me os pêlos do meu braço esquerdo. Será que meu destino seria pecar? Sempre soube que vida de marafona era dose.
 
Que Deus me livrasse dos maus desígnios. Afinal, apesar de estar um tanto quanto gorda, ainda assim, com algum treino, tinha absoluta certeza, poderia fazer bonito em qualquer maratona.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 16:17

Coisa de bêbado

por Fernando Zocca, em 16.10.09

 

Naquela tarde quente de quinta-feira, dez de janeiro, haveria na casa da Luisa Fernanda, mais uma reunião festiva regada com muitos fluídos alcoólicos. Primeiro a chegar, Van Grogue tinha o rosto afogueado e brilhante, sinais indicativos de que já estava “mamado”.
 
A piscina caseira, no fundo do quintal, continha águas turvas e apesar das queixas constantes dos vizinhos, sobre a possibilidade óbvia da disseminação da dengue, Luisa pouco se importava com os reclamos considerados inoportunos.
 
Van foi recebido pela anfitriã, que agindo com certa exaltação eufórica, puxou-lhe uma cadeira metálica componente de um grupo de quatro em cada mesa. Havia um conjunto de cinco mesas brancas também metálicas, dispostas ao redor da piscina verdolenga.
 
Luisa passou a conversar com Grogue, ofereceu-lhe um copo de cerveja e este acendeu um cigarro. Entretidos na conversa foram logo interrompidos pelos demais convidados que chegavam; estes bem descontraídos e à vontade, acomodavam-se nos locais que escolhiam.
 
O clima estava tranqüilo, no ar pairava um aroma de salgadinhos, perfume e cerveja, quando de repente, o poodle da Luisa, tomado por um acesso incontido de agitação, passou a latir desenfreado.
 
Lá em cima do muro, Isauro o vizinho chato, conhecido nos bares do bairro como boca-de-porco, por causa da halitose repugnante, gritava pedindo silêncio.
 
O burburinho emanante da reunião arrefeceu. Todos olharam para aquele ponto inflamado sobre a parede O cachorro continuava latindo.
 
Isauro diante do silêncio que se formou, e torcendo para que a dentadura não lhe escapasse da boca, disse:
 
- Gente, pelo amor de Deus! Eu preciso dormir. Tenho que levantar cedo para pegar no meu serviço. Assim não tem quem agüente.
 
As pessoas voltaram-se umas para as outras e todas buscando, com o olhar para Luisa Fernanda uma orientação, viram pelo gesto que ela fez, que poderiam continuar divertindo-se sem maiores problemas. Que não se preocupassem.
 
Luisa Fernanda girara o indicador da mão direita em torno da orelha do mesmo lado, dizendo com aquilo que Isauro era maluco, e que desmerecia atenção.
 
Isauro calou-se diante da zoada que recrudescia, arrumou os fios rebeldes da peruca nova, descendo então do muro.
 
Mas logo os comensais tensos puderam ver horrorizados que tijolos eram lançados contra eles. Houve um alvoroço, um corre-corre e alguns caíram empurrados por outros.
 
Ameaçando de morte aquela gente toda, Isauro ofegante, por causa do tabagismo, atirava tijolos enormes contra os festeiros sem, no entanto, acertar nenhum em ninguém.
 
Esquivando-se, protegendo-se e sentindo-se seguros, os convivas puderam observar até que ponto ridículo e absurdo a insanidade provocada pelo alcoolismo, analfabetismo, e tabagismo podem levar alguém, apesar da idade avançada.
 
Isauro vestia uma bermuda verde suja, um par de chinelos rotos e uma camiseta azul sem mangas. Seu rosto congestionado indicava intoxicação; ele só não invadiu a casa da Luisa Fernanda por absoluta falta de preparo físico. A taquicardia e taquipnéia impediram-no de coordenar os pensamentos e, o máximo que ele podia pronunciar para a vizinha era a frase: “vou te matar”.
 
Na verdade Isauro estava louco, impregnado pela pinga ruim, cerveja de garrafa com tampinha enferrujada e cigarros baratos.
 
Apesar dos esforços da Luisa Fernanda, feitos para impedir a debandada, não houve mesmo jeito.
 
A festa acabara e a reunião fora desmanchada num clima lúgubre de revolta que se apoderou das pessoas. Todos foram embora indignados.
 
Arrasada, envergonhada e prometendo revanche, Luisa Fernanda sentou-se ao seu teclado, onde passou a dedilhar velhas melodias.
 
Ela tocava de ouvido e apesar do medo que sentia, diante de uma outra provável investida de Isauro, deixou-se levar pelo encantamento dos sons mágicos.
 
No dia seguinte Luisa, ainda bem ressentida, tratou logo de esquecer as ocorrências partindo, bem cedo, para a academia onde dançaria boa parte do tempo.
 
 
Fernando Zocca.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 14:39

Homem mata a mulher e depois se suicida

por Fernando Zocca, em 15.10.09

 

Um homem matou a mulher a tiros e depois se suicidou por volta das 19h30 na Avenida Rebouças, na cidade de São Paulo, informou a Polícia Militar (PM). Ainda de acordo com os primeiros dados da PM, os dois morreram na hora e não chegaram a ser socorridos.
 
A polícia ainda não tem detalhes do suposto homicídio. O 15° Distrito Policial (Itaim Bibi) atende a região do fato e o caso deve ser encaminhado para registro nesta delegacia.
 2508081009
 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 15:38

A saia justa da Maitê Proença

por Fernando Zocca, em 14.10.09

 

A atriz Maitê Proença gravou em 2007 um vídeo lá em Portugal tirando o maior sarro das coisas portuguesas, terminando ainda aquela sua obra, com uma cuspida numa fonte histórica.
 
            Não se sabe por que a produção só veio à luz, na internet, por esses dias e não bastou muito tempo para gerar uma onda tremenda de protestos contra a agressão moral. Fizeram até um abaixo assinado contra a manifestação infeliz, pedindo a ela que não pusesse mais os pés lá onde era sempre bem recebida e tinha seus livros consumidos.
 
            Foi patifaria gratuita. Maitê Proença tem dois avôs portugueses, viajava constantemente para Portugal, era querida pelo povo que adquiria os livros que escrevia.
 
            Qual seria a intenção de Maitê Proença ao agredir o povo português, sua história, costumes e tradições?
 
            Se a atriz brasileira ao caminhar pelas ruas de Lisboa e outras cidades fosse, digamos vítima do que se conhece por bullying, assédio moral ou provocasse uma rejeição imotivada, certamente teria razão em defender-se. Mas não. Os ataques foram gratuitos, sem razão que os justificasse.
 
            Esses motivos ocultos deveriam ser revelados. Maitê, ante as ondas gigantescas dos protestos que gerou, pediu desculpas ao povo português, dizendo que tudo tinha sido uma brincadeira.
 
            Até as novelas brasileiras, compradas pelos portugueses, podem deixar de ser adquiridas por causa do vacilo da atriz e escritora. No vídeo de 54 segundos, que ela gravou pedindo desculpas, afirma que o “brasileiro é brincalhão” e que “brinca com tudo”.
 
            A ira que Maitê despertou nos portugueses veio expressa nos milhares de comentários feitos aos pés das notícias que divulgavam o vexame. A agressão que a senhora Maitê Proença produziu foi levada ao ar em 2007, no programa Saia Justa, da GNT.
 
            Os xingamentos a Maitê Proença foram tantos que ela, visivelmente numa saia bem justa, pede desculpas pelo mal causado. A repercussão negativa foi tamanha que sumidades da imprensa brasileira puseram-se logo a campo em defesa da ilustre senhora.
 
            A atriz brasileira recentemente viu-se numa outra saia justa quando a escritora Ligia Fagundes Telles queixou-se que o título As Meninas, usado por Maitê numa peça de sua autoria, seria plágio do nome de um romance dela, da Ligia.
 
            Portugal pode ser considerado uma porta legítima pela qual passem os produtos brasileiros rumo à Europa toda. Que a maluquice da Maitê não seja o início de uma política de esquiva do povo português ao consumo dos produtos brasileiros feitos por gente de boa vontade.
 
 
Fernando Zocca.  
              

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 16:54

A toada

por Fernando Zocca, em 13.10.09

 

            Falta de respeito, de educação. Assim é que se define a atitude dos saciados zombadores frente àquilo que pra eles nada pode significar. Mas o que se pode esperar para  quem rouba, sem ser roubado, destrói sem antes ter sofrido a destruição?
            Por que agiria de forma tão deletéria o comportamento diruptivo? Estaria o tal agente sujeito pelas pressões insustentáveis a ponto de sair agredindo, ou agiria sob o manto da vingança?
            Atua de forma legítima o indivíduo que, a guisa de defender um irmão prejudicado, direciona seu repertório de maldades, contra o filho indefeso do prejudicador?
            A mãe atarefada, atribulada nos afazeres do lar, insensível ao fato de que se torna tão ou mais importante ouvir do que manifestar-se, não seria eximida da culpa pelos acontecimentos futuros desagradáveis que acometeriam sua prole?
            Pode alguém não ter consciência de que promessas podem ser quebradas, esperanças frustradas, ou um desejo ardente insatisfeito, por incúria no manifestar-se e negligência no ouvir?
            Quem negaria que as paredes têm ouvidos e que há milhões de ouvidos emparedados, insensíveis às realidades do dia-a-dia? Há aqueles que fechados em si mesmo, fascinados, absortos, não se preocupariam com as palavras emitidas, não podendo crer que elas gerariam tragédias pessoais indeléveis.
            Não podemos nos esquecer que não estamos sós. Mesmo no lar, entre as paredes, existe a percepção dos acontecimentos. Os passarinhos verdes das palmeiras, ávidos de novidades, se encarregariam de levar aos outros pássaros verdes, também das palmeiras, as novas sobre as nossas atitudes.
            Há quem tenha consciência disso tudo e, no seu proceder verbal utilize manobras objetivando confundir os emplumados. Mas não podemos nos esquecer que a percepção é um fenômeno fisiológico. Assim como a acuidade visual varia de pessoa para pessoa, todos os demais sentidos, como a audição e o tato, são mais desenvoltos em uns do que em outros.
            É importante que saibamos que as toadas prejudiciais nascem também do que coletam os tais passarinhos verdes das palmeiras. Os compromissos firmados com a moral, os bons costumes, a religião, a religiosidade, não poderiam ser esquecidos ante as novas perspectivas que surgem no horizonte.
            Mas seriam moralmente condenáveis, os pássaros verdes das palmeiras, que ao coletarem as gotículas vaporosas esvoaçantes, as levassem para alimentar a toada dos outros bípedes de penachos?
            Não daríamos motivos para fofocas mortais, destruidoras, se tivéssemos mais cuidado com o que dizemos. O futuro, a saúde, o bem estar, o trabalho, as amizades e todos os demais valores estão sujeitos ao que expressamos, seja em público ou entre as quatro paredes.
             

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 18:21

Paixões a arder

por Fernando Zocca, em 10.10.09

 

È inegável que a violência grassa nas grandes concentrações humanas. Não são incomuns as reuniões de pessoas que passam horas a bebericar, para depois, por um me da cá aquela palha, agredirem aos próximos com chutes no peito ou garrafadas nos costados.
 
De quem seria a culpa de tanta selvageria, de tanta falta de educação? Como você pode dizer ao pai de um moço amancebado, viciado em drogas, que seu filho agride pessoas com palavras, fisicamente com pontapés e garrafadas, se o próprio pai do meliante também passou por condenação penal e não está nem aí com o problema?
 
Como pode o cidadão comum dirigir-se à gordurosa mãe do proxeneta a fim de lhe pedir a frenação da loucura daquele produto podre do seu ventre? Ô carniça!
Que tipo de conversa teria você, meu amigo leitor, com um assassino em potencial, que faz do ócio dos seus dias inúteis, momentos de perturbação do sossego alheio?
 
Que diria você, minha amiga leitora, para uma pessoa sustentada com o dinheiro que recebe a concubina, em decorrência de uma ação de alimentos proposta contra um pobre infeliz ingênuo, apanhado na armadilha da barriga de aluguel?
 
O que diria o senhor delegado de polícia, a senhora assistente social da prefeitura, para as pessoas amontoadas em cortiços de onde não se vê sair nada de bom que não seja drogas ilícitas?
 
Observa-se, em alguns trechos, da abandonada Vila Independência muitos cistos, cabeças-de-porco, verdadeiros chiqueiros formados por amontoados de pessoas vindas de famílias desfeitas, totalmente privadas de boas maneiras e civilidade.
 
Onde estão os pais responsáveis por esses selvagens? Onde está a autoridade policial a quem incumbe a repressão ao tráfico de drogas ilícitas?
 
Onde estão as autoridades legislativas e do executivo dessa cidade? Estariam por certo em lugares diversos dos demais trechos em que permanecem imobilizadas nas perenes poses para as fotos com as quais se exibem ao púbico?
 
Cadê a educação das jovens adolescentes abandonadas pelo pai irresponsável, quiçá agalhado pela mulher leviana? Onde está a responsabilidade do avô libertino, que nada faz pela educação das aprendizes de meretriz, a não ser esperar com avidez o pagamento efetivado constantemente pelo poder público?
 
Onde está a sensatez da velhota ocupante do lugar da avó morta em circunstâncias ocultas?
 
Onde estão os pais da moça que vive no bem-bom usufruindo as pensões alimentícias, pagas por homens diversos, genitores dos filhos adulterino e natural?
 
Que segurança se pode ter nestes bairros distantes onde no mínimo você pode levar um pontapé no peito ou uma garrafada nas costas?
 
Piracicaba é maior do que esse lixo hospitalar, lixo de cadeia, lixo de prostíbulo, e lixo de botequim que se acumula nos cortiços obscuros e tenebrosos da cidade, justamente neste começo do fim do mundo.

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 18:19

O gole generoso

por Fernando Zocca, em 09.10.09

 

           Mariel Ardeu Demorais na tarde de quinta-feira, entrou já bastante cansado, no bar do Bafão pra comprar o seu costumeiro maço de cigarros. Assim que o recebeu leu a tarja “CIGARRO PROVOCA IMPOTÊNCIA SEXUAL”. No mesmo instante devolveu-o perguntando:
          - Você não pode trocar este por aquele que PROVOCA SÓ CÂNCER?
         Bafão considerou as altas taxas de pinga contidas naquele corpo, evidenciadas pelo olhar zonzo, rosto afogueado e pés inchados, como as motivadoras dos disparates. Mas mesmo assim respondeu:
           - Já está mais do que na hora de você encomendar o espírito. O corpo já foi. É ou não é, Mariel?
           - Ah, deixa disso, mano! Trabalho o dia inteiro naquela oficina e quando vou refrescar a goela tenho que ouvir essas loucuras? Ora, faça-me o favor. Ocê sabe que se eu só fumasse corria o risco de ficar doente. Mas não. Ocê não vê que eu gosto de tomar muita cerveja? É isso que me livra a cara.
           - Hum... Tá bom. Vai querer pinga antes da cerveja? – no mesmo instante em que falava Bafão asseava o tampo do balcão com uma toalha branca.
           - Bota o de costume.
         Bafão percebeu que Mariel estava irritado. Talvez o serviço na oficina não estivesse muito agradável. As cobranças eram constantes e o esperado retorno financeiro não se mostrava à altura de produzir a satisfação plena.
         - Você não ficou sabendo o que aconteceu com o Van Grogue? – perguntou Bafão, ao servir o freguês com a pinga.
         - Faz tempo que não vejo o Grogue. Por onde anda aquela desgraça?
         Bafão tirou da geladeira uma garrafa geladíssima de cerveja, abriu-a a vista do consumidor e ao ajeitar um copo limpo ao lado da vasilha, continuou:
         - Van Grogue esteve trabalhando como colocador de carpetes. Foi por isso que não apareceu mais por estas bandas. Dizem que está ganhando muito dinheiro.
         - Ele esteve lá na oficina, no mês passado. Reclamou do barulho, mas depois foi embora. A turma diz que ele voltou a beber. Será verdade?
          Bafão respondeu:
         - Olha, que eu saiba, o Grogue nunca parou de beber. Foi o pessoal que deixou de ver ele encharcando a cara. Disseram que um dia ele estava tão louco, mas tão louco de vontade de fumar, que depois de ter colado o carpete na sala do Cidão Boyola, viu uma elevação que se destacava bem perto do meio. Ele achou que era o maço de cigarros que havia esquecido ali. Com preguiça de refazer o serviço, ele simplesmente pegou o martelo e amassou, à pancadas, o calombo. Bom, quando já se preparava pra ir embora, a mulher do Cidão Boyola apareceu trazendo o maço de cigarros dele, - do Grogue - esquecido em cima da mesa da cozinha. Depois que Van o guardou bolso, a mulher lhe perguntou se não tinha visto o filhote de gato que viera para a sala. Ocê acha que o Grogue teve a coragem de responder que tinha visto o filhote de gato?
         - Eu acho esse Van Grogue um tremendo chato. Dizem que ficou amigo do Jarbas. É verdade? – Mariel demonstrava, já com a voz embargada, interesse inusitado em saber algo a mais sobre o famoso pinguço de Tupinambicas das Linhas.
         Bafão emendou criticando:
         - Imagine que o Grogue fez amizade com o Jarbas! É mais fácil uma vaca voar! Depois que a seita maligna do pavão-louco, a serviço do prefeito caquético testudo, “sujou a água” dele na cidade, o Grogue tem medo até de ir à praça ao entardecer. Ocê sabe muito bem Mariel: gato escaldado tem medo de água fria.
         - Pois eu acho que fez muito bem esse prefeito! – enquanto falava Mariel Ardeu segurava o copo de cerveja suspenso diante dos olhos – Tinha mais é que dar uma sova nesse cara sujo.
         Aquietadas as emoções, depois da ingesta de mais um gole generoso da cerveja que já não estava tão fria assim, Mariel Ardeu Demorais pôde ver a beldade loura que entrava no recinto. Era Luisa Fernanda, a gerente que tentava “há séculos”, tocar de orelhada o hino do Corinthians naquele seu teclado vetusto.
         Rebolando aquela sua bundinha flácida Luisa disse categórica:
         - Seu Bafão, me embrulha, por favor, 360 gramas de mortadela da boa. Mas olha: é da boa, hein! Não quero enganação.
         - Sim, senhora. É pra já. – Respondeu Bafão solícito.
         Notando que o silêncio do ambiente o incomodava Mariel Ardeu estendeu a mão em direção à mulher dizendo:
         - Olá, como vai dona Luisa? E a greve já acabou?
         Luisa Fernanda afastando-se do homem, como alguém que se afasta de um cão fedorento, murmurou algo parecido com “o que é isso?”, mas disse em voz alta:
         - Não ponha a mão em mim!
         Sem impedir a vazão dos sentimentos horríveis que lhe bagunçaram a alma naquele momento, Mariel Ardeu de Morais disse às costas de Luisa Fernanda enquanto ela saia carregando o embrulho.
         - Vai ficar louca!
         Bafão anotando o débito na conta da freguesa, nem deu tanta importância ao fato. Sabia que aquilo era ainda o reflexo da quizumba antiga havida entre aqueles pobres “cachorros pequenos”.
 
 
 
Fernando Zocca.
 
 
(texto revisado)  
               
        
        

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 21:00

Capital fluminense sedia os Jogos de 2016

por Fernando Zocca, em 03.10.09

 

O presidente Luis Inácio Lula da Silva, o governador do Estado do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, o prefeito do Rio Eduardo Paes, juntamente com todos os demais membros da delegação brasileira que foram à Copenhague, na Dinamarca defender a realização dos Jogos Olímpicos em 2016 na cidade maravilhosa, vibraram eufóricos com a notícia da escolha da capital fluminense.
 
            O Rio participou de um jogo duríssimo disputando o privilégio com Chicago, a cidade norte-americana que tinha o aval de Barack Obama; com Tókio que alegava ter quase todas as instalações prontas e, Madri que informava possuir a maior aceitação popular para o evento.
 
            Pela escolha dos jurados, Chicago foi a primeira eliminada, cabendo à Tókio vir em seguida. Os fluminenses esperavam ansiosos a decisão que se daria entre o Rio ou Madri.
 
            Depois de muita expectativa os responsáveis emitiram seus votos, mas o anúncio do resultado foi  postergado para depois das 12 horas, (horário de Brasília).
 
            Lula, bastante convincente, no discurso que fez em defesa da escolha da cidade brasileira, falou com serenidade, sendo seguido pelo Governador Sérgio Cabral e pelo prefeito Eduardo Paes. Também sustentaram oralmente o desejo nacional, o presidente do Banco Central Henrique Meirelles, o ex-presidente da Fifa João Havelange, o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro Carlos Arthur Nuzman e a medalhista olímpica Izabel Swan.
 
            Escolhido por 66 votos contra  32 de Madri, o Rio de Janeiro presenciou uma festa enorme realizada na praia de Copacabana, onde houve até show de artistas brasileiros consagrados. 
 
            O Rio inaugura um nova era na história dos jogos olímpicos porque nunca foram antes realizados na América do Sul. Aliás, esse foi um ponto importante tocado pelo discurso de Lula, que salientou a oportunidade dos integrantes do COI em vencerem o desafio de expandir os Jogos Olímpicos.
 
            Os governos federal, estadual e municipal pretendem, juntamente com a iniciativa privada, resolver os problemas que dificultariam a realização do empreendimento, utilizando a verba de R$25,9 bilhões, a serem empregados principalmente na hotelaria e sistema público de transporte.
 
 Fernando Zocca. 
 
   

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 01:38

Fugindo do dentista

por Fernando Zocca, em 01.10.09

 

- Sabe seu Zé, essa negadinha fica falando que eu sou um cara relaxado, que não ligo pra cuidar dos meus dentes e piriri-pororó. Eles não sabem que sem os dentes minha boca fica maior, cabendo mais comida. E depois tem mais, viu seu Zé: quem agüenta tanta dor pra tratar os canais? Veja bem: quando eu era ainda menino, meu pai me mandava ir pro dentista por qualquer motivo. E lá no consultório aquele homem alto, chato e feio, me mantinha com a boca aberta, contando os casos que ele tinha com as namoradas. Quando o cara percebia que eu estava ficando excitado, empurrava com força aquelas suas brocas terríveis nas minhas covas inflamadas. Sabe, quem é que agüenta tanta maldade e judiação? Assim a gente não resiste. E vai deixando de lado essa história de tratar os dentes. E depois tem mais viu seu Zé: o cara não se preocupava se aquele amálgama que ele preparava continente de mercúrio me intoxicaria ou não. Os resíduos das obturações não eram retirados imediatamente, permanecendo, às vezes, durante o tempo todo da estadia no consultório, debaixo da língua. Sabe seu Zé a gente não somos  paranóicos, mas sofremos muito nas mãos dessa turma de malvados. E por falar nisso, eu me lembrei de uma visita rotineira que fazia ao oculista, o cara depois de algum tempo, olhou-me bem de perto, tendo aproximado seu rosto do meu, quase o tocando. Eu acho que ele intencionava observar os capilares da retina. E depois que lhe respondi uma pergunta que fizera, sabe o que ele afirmou? Ele disse: - Você é louco. Tudo bem, mas precisava ser assim tão direto, convincente, declarado, e verídico? “Ora direis, ouvir estrelas, certo perdeste o senso”, lembrei-me eu do que aprendera na escola. Mas voltando ao assunto você não acha que se eu for agora ao dentista não perderei um tempo importantíssimo, em troca de uma “perereca” fajuta que vai mais me importunar do que proporcionar satisfação? Ora, ora. E depois tem mais, viu seu Zé: pra que preciso de dentes se no meu serviço eu não os uso? Meu trabalho é endireitar, com marteladas, as latas que se encontram tortas e amassadas. Veja que dos 32 nem mesmo tenho os 28. Quem é que dorme com um barulho desses?

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 16:39

Pág. 2/2



Mais sobre mim

foto do autor


Pesquisar

  Pesquisar no Blog

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.


Arquivo

  1. 2020
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2019
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2018
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2017
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2016
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2015
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2014
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2013
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2012
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2011
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2010
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2009
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D