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O selo

por Fernando Zocca, em 25.05.09

 

                            A tia Ambrosina naquela manhã de quarta-feira, 29 de julho, bastante calma sentou-se com delicadeza no sofá macio da sala de seu apartamento e, tomando o telefone, discou usando o polegar direito, o número do Zé Lagarto.
                            Quando ela percebeu que foi atendida disse:
                            - Zé, que falta de vergonha é essa? Saiu em todos os jornais da cidade que vocês vereadores estão gastando mais de R$ 4 mil por mês, cada um, só com telefonemas. Mas o que é isso?
                            Lagarto que chegara há pouco e tirara do cofre do seu gabinete o notebook, doado pela prefeitura, onde mantinha arquivados os seus projetos, depois de confirmar ser a tia Ambrosina que o procurava, atendeu o celular:
                            - Oi tia, como vai? E o Jarbas, tudo bem com ele? O baço melhorou? Han? Telefone? Ah, sim. As despesas passam dos R$ 4 mil mensais, mas olha, já mandei cortar tudo, pode ficar sossegada.
                            - José Lagarto, ponha a mão na consciência. Será que você não consegue passear, por uma hora diária, que seja, pela periferia da cidade e constatar o miserê dominante? Será que eu tenho que ficar puxando a orelha de vocês por essas barbaridades que cometem? Mas onde já se viu, criatura, gastar esse dinheirão com telefonemas? Até parece que todos os assuntos tratados são do interesse da cidade! Ah, faça-me o favor Zé, vê-se te emenda! – Ambrosina estava bastante irritada.
                             - Não se apoquente não tia. Não se deprima. Eu como presidente desta casa, tenho a honra de lhe informar, em primeira mão, que criamos um selo de qualidade e aproveitamento, que distinguirá nos finais de ano, todo vereador que não ultrapassar uma cota, cujo valor ainda estabeleceremos. Vai ficar jóia. O dinheiro economizado irá para uma caixa comum e será dividido entre as entidades carentes dos bairros.
                            - Zé Lagarto, olha, estou de olho em você! Essas importâncias que vocês gastam com telefonemas são maiores do que o salário de muita gente junta. – o tom de voz da Ambrosina era daqueles característicos de quem reprime a raiva. - Você e o Jarbas me conhecem muito bem. Não será preciso eu aparecer pessoalmente no gabinete de vocês para que ajam corretamente, não é?
                            - Não é preciso a senhora baixar por aqui... Quero dizer: não é necessária a sua presença. Já tomei todas as providências. As despesas serão reduzidas. Haverá publicação mensal de todos os gastos e tudo ficará bem.
                            - Eu acho muito bom isso tudo. E olha, vê se para de mandar perseguir a Elza. Ela não merece isso que vocês estão fazendo. Podem parar com a zoação. – Ambrosina desligou o telefone, levantou-se lentamente do sofá e caminhando em direção à cozinha onde tomaria um café bem doce e forte, murmurou:
                             - Se nem para a garantia dos direitos essenciais, que são visíveis, a população de baixa renda pode contar com esse poder instalado, imagine então o que não aconteceria, com a incolumidade dos cofres públicos que são invisíveis.  
 
 
Fernando Zocca.  
 

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publicado às 19:22


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